sábado, 31 de julho de 2010

Tenente João Gomes de Lira

O inimigo de Lampião

Por: Leonardo Ferraz Gominho (*)

Amigo dos padres, inimigo dos cangaceiros. João Gomes de Lira, filho do velho Antônio Gomes Jurubeba (de Nazaré), escreveu um livro - Lampião, Memórias de um Soldado de Volante - onde, entre outras coisas, diz à página 367: - “Naqueles dias (final de 1926 ou início de 1927) verificou-se a visita de Lampião à cidade de Floresta. O primeiro ponto a chegar ali Lampião foi a conhecida Quixabeira de São (sic) Bom Jesus.

Foto: Kiko Monteiro
Ali o chefe Lampião deixou uma parte do grupo seguindo para a cidade com os cabras de sua maior confiança. Em Floresta Lampião visitou chefes políticos do município. Na época foi comentado que existia uma indiferença entre Lampião e os irmãos Gominho, por ter um deles dado a um cachorro o nome de Lampião que, por cujo motivo, o cangaceiro incendiou um caminhão de mercadoria do sr. Fortunato Gominho.

Dizem também que a entrada de Lampião em Floresta causou muita preocupação aos Gominho, pois por serem homens de respeito e amantes da paz, só desejavam a tranquilidade para todos. Também comentou-se que Emiliano Novais, amigo de Lampião, foi o intermediário em acabar com a indiferença entre os Gominho e Lampião, sendo naquele dia passada uma esponja no que existia. A entrada do cangaceiro em Floresta foi à noite. O bandido passou o resto da noite na cidade, tendo viajado na manhã do dia seguinte nos caminhões de Augusto Ferraz e Aprígio de tal.”

Na foto acima Tenente João ainda vivo, com 97 anos e 28 dias, em 31-07-2010.

Estranhamos, no texto acima, três afirmações do Sr. João Lira: primeiro, de que Lampião visitou em Floresta “chefes políticos do município”; segundo, que após a intermediação de Emiliano Novais foi “passada uma esponja no que existia” entre Lampião e os irmãos Gominho; terceiro, que o cangaceiro viajou no dia seguinte “nos caminhões de Augusto Ferraz e Aprígio de tal”. Houve aqui, sem sombra de dúvidas, equívoco do autor. E se comentários dessa natureza ocorreram na época, foram infundados. Vamos aos fatos reais. O Dr. Anselmo Ferraz é muito claro:  
- “Meu irmão Augusto nunca carregou bandidos no seu caminhão, muito menos os de Lampião. Emiliano nada fez pela paz entre Siato e Lampião, mesmo porque Siato não o aceitaria absolutamente, confiando sim a sua segurança a nossa família que o apoiava totalmente. Lampião sabia disso muito bem.”
Por sua vez, consultado a respeito, o Dr. José Goyanna, neto de Antônio Ferraz de Souza - este o maior líder e chefe político de Floresta, naqueles tempos -, foi taxativo a respeito da versão dada pelo Sr. João Lira:
- “Ela se torna fantasiosa, inverídica mesmo, quando afirma que Lampião, naquela noite, visitou “chefes políticos” em Floresta. De fato, foi voz corrente que, numa determinada noite daquele ano, Lampião, na calada da noite, entrou em nossa cidade acompanhado e ciceroneado por Emiliano Novais. É provável que ele tenha feito visitas, mas não aos chefes políticos locais. 
Ele deve ter visitado aqueles que ganhavam dinheiro favorecendo e negociando com a sua “poderosa” amizade. Lampião deve ter deixado o seu grupo à entrada da cidade, talvez mesmo na Quixabeira do Bom Jesus. Mas daí a se dizer que ele andou visitando pessoas de bem, vai uma grande distância. À época eu tinha doze para treze anos. À minha curiosidade de menino não passava despercebido fato de tamanha importância na vida da cidade. Nem jamais ouvi qualquer comentário do meu avô (Antônio Ferraz) a respeito, senão o de que Lampião estivera na cidade, nas condições já descritas, e que tomara cerveja com os seus amigos e hospedeiros.”
 “O que acontecia” - continua José Goyanna - “era que Lampião tinha um grande respeito para com a nossa família. Inteligente como era (isso não se pode negar) não interessava a ele abrir luta contra uma família numerosa, com poder econômico e com disposição para não se deixar desmoralizar pelas suas truculências.
Numa das vezes em que meu avô dialogou com ele, logo após o assalto à Baronesa de Matinha de Água Branca (meados de 1922), assunto questionado na ocasião, Lampião tentou explicar que procedera daquela forma como pagamento ou agradecimento seu a determinado amigo de cujo nome não estou lembrado. Na mesma ocasião o meu avô exprobrou-lhe o procedimento de ele estar, por carta, mandando pedir dinheiro a pessoas pacatas que nada tinham a ver com as suas estrepolias (por essa época Siato havia recebido uma carta pedindo dinheiro e munição). A essa reprovação, Lampião respondeu que só pedia dinheiro às pessoas suas amigas.

A esse argumento, meu avô lhe disse que ele estava simplesmente incomodando pessoas que não tinham nenhuma obrigação de financiar o seu modo de vida e, além disso, ele estava se expondo a fazer novos inimigos porque só atendiam a esses pedidos aqueles que lhe tinham medo. Os que não tinham, simplesmente se negavam a essas “contribuições” e, com isso, ele arranjava mais um inimigo.

Nessa ocasião, foi-lhe oferecida alguma recomendação no sentido de ele querer mesmo deixar aquela iniciante vida de bandido. Lampião chegou quase a prometer aceitar o conselho que lhe fora dado. Como reforço de sua argumentação, o meu avô citou o exemplo de “Sinhô” Pereira que, deixando uma vida de crimes recém-iniciada, retirou-se para o sul e, segundo corria, chegara a ser promovido a Oficial de Polícia de determinado Estado do Centro-Sul. Como se depreende, Lampião não cumpriu aquele quase pacto que, se cumprido, o Nordeste teria se livrado do flagelo que foi a sua vida de crimes e de violências. Mas, se não foi cumprido, daquilo tudo restou um grande respeito que o bandido sempre demonstrou ter para com Antônio Ferraz.”

 Tenente João Gomes, em época turbulenta.

E mostra esse respeito: - “Uma vez chegamos à fazenda Serrotinho, demos pela falta de um carneirinho “enjeitado” que o meu avô havia me dado e que era meu companheiro de brincadeiras, quando na fazenda. Como resposta a nossa indagação, o vaqueiro apresentou uma carta de Lampião, explicando que tendo chegado à fazenda e o grupo estando sem mantimentos, ordenara que se matasse aquele carneirinho que, depois, mandaria pedir a conta ao meu avô. De fato, na carta ele explicava os motivos daquela “desapropriação” e pedia que lhe fosse apresentada a conta do valor do carneirinho. O meu avô não lhe apresentou aquela conta. Certamente se lhe tivesse apresentado, ele a teria pago.”

Quanto à inimizade de Lampião com Siato e João Gominho Filho, José Goyanna definiu a posição de Antônio Ferraz (que era concunhado de Antônio de Sá Gominho, irmão de Siato): - “não era interessante abrir luta contra o bandido. As nossas fazendas eram desguarnecidas, estavam expostas ao capricho dos bandidos. A não ser Ildefonso Ferraz (sobrinho de Antônio Ferraz), os demais fazendeiros não dispunham de meios para garantir suas propriedades contra as arremetidas dos bandidos. Porém, os Gominho podiam ficar descansados porque em caso de ataque de Lampião a qualquer dos dois irmãos, a família entraria em luta sem qualquer hesitação, indo em socorro de suas vidas.

Acordo com Lampião, nunca houve. Isso jamais poderia passar pela cabeça dos então dirigentes da política florestana.

Vou citar mais um fato para corroborar com o meu pensamento e como desmentido à versão do livro do Sr. João Lira. Naqueles anos, houve uma ocasião em que Lampião tinha necessidade de passar em frente à fazenda Curral Novo. À época, ele estava com oitenta cabras. Apreendeu um caminhão que passava pela estrada. Mandou retirar toda a carga. Ele estava ali pelo Governador. “Atenciosamente” mandou um portador levar uma carta para o tio Ildefonso Ferraz, pedindo-lhe uma entrevista. A princípio Ildefonso hesitou em atender ao convite, preferindo reforçar a sua fazenda e “meter-lhe bala” se ele tivesse a petulância de passar com o seu grupo na frente de sua casa.

Depois, “para ele não pensar que estava com medo dele”, Ildefonso, após mandar avisar às fazendas próximas, resolveu atender ao pedido. Devidamente armado e municiado (pra bandido nenhum botar defeito), em companhia de Deoclécio Ferraz (cunhado dele) e mais “Caneta” e outro cabra que agora não me ocorre o nome, dirigiu-se ao ponto de encontro.

Lampião, avisado da aproximação do tio Ildefonso, levantou-se do lugar onde estava sentado, encostou o seu mosquetão à parede, obediente àquele código de honra vigente entre os sertanejos, e foi assim, desarmado, ao encontro dos que chegavam. Só quem vinha a cavalo era tio Ildefonso. Ao ajudar o cavaleiro a desmontar (tudo dentro daquele código) foi logo dizendo, em tom de brincadeira, que tinha mandado chamar tio Ildefonso como amigo mas via que ele tinha atendido ao convite “armado até os dentes”.

Tio Ildefonso lhe disse, então, que estava ali também como amigo, o que não impedia estivesse armado e pronto para qualquer emergência. Ao que Lampião respondeu que eles eram apenas quatro, enquanto o seu grupo dispunha de oitenta homens. Tio Ildefonso respondeu-lhe que aqueles quatro poderiam lhe “dar muito trabalho.” Lampião, sorrindo, disse que aquilo tudo era uma simples brincadeira.

Durante a conversa que se seguiu, o bandido perguntou, por três vezes, como estava o seu interlocutor. Tio Ildefonso, nas três vezes, respondeu que estava bem, sem problemas. Aquelas três perguntas tinham por escopo oferecer vantagens, talvez até pecuniárias, diante de respostas pouco firmes. O que não se deu.

Como corolário àquele “téte-a-téte”, tio Ildefonso disse que tinha um pedido a lhe fazer, depois de cientificado de que ele, Lampião, lhe pedia licença para passar com o seu grupo pela frente da sua fazenda. Coube, agora, a tio Ildefonso fazer o seu pedido: já que ele estava ali, ele podia continuar a viagem, mas que evitasse passar novamente, porque “a minha família tem compromisso com o governo” e não era conveniente que qualquer aproximação entre eles pudesse parecer um conluio, um traço de ligação.

O transporte do grupo foi feito em duas vezes. A primeira leva, quando chegou ao Curral Novo, já encontrou uma recepção à altura porque os parentes, avisados do evento, acorreram devidamente “apetrechados” para a ocasião. Passaram-se coisas engraçadas, dentre as quais pode ser citada aquela protagonizada por Manoel Ferraz (irmão de Horácio e de Oscar Ferraz, entre outros) que, devido à pouca iluminação do local e já era noite, pediu licença a Lampião para lhe iluminar a cara, com a “sutil” justificação de que poderia um dia “estar numa emboscada” e assim poder reconhecer, no meio do grupo, quem era Lampião.”

Esse fato, peculiaríssimo, merece ser narrado. Depois do encontro de Ildefonso com Lampião, o qual se dera na fazenda Várzea Comprida, de Martim Ferraz, o cangaceiro dissera que, ao chegar ao Curral Novo, queria ainda falar com Ildefonso.

Quando o caminhão ali chegou, o chefe dos celerados desceu e mandou que os demais continuassem no veículo. Chamou Ildefonso para um particular. O fazendeiro convidou Lampião para entrar em casa, dirigindo-se a um dos quartos. Foi seguido pelo cangaceiro e por Manoel Ferraz (v. Tenente-coronel João Serafim de Souza Ferraz). Já a sós, Lampião olhou para Manoel e perguntou quem ele era. Ildefonso respondeu que era um primo. O bandido perguntou ainda se era de confiança. O dono da fazenda respondeu que sim, que podia falar à vontade.

Lampião era, sem dúvida, um homem informado, principalmente sobre as coisas do seu interesse. Sabia que Ildefonso tivera um grande prejuízo quando um comprador de Belo Jardim ficou com uma boiada de sua responsabilidade e não o pagou. Disse, então:
 - Ildefonso, você teve um prejuízo e eu quero lhe compensar. Vou arrumar dinheiro para você comprar seus bois a dinheiro. E do dinheiro que eu lhe arrumar, você tira uma parte e vai comprando uma muniçãozinha para mim.
 O fazendeiro e boiadeiro respondeu de imediato:
 - Não faço isso, não. Eu não sou homem para fazer uma coisa dessa. Eu sou um homem da sociedade, um homem do governo, o governo confia em mim e eu não faço uma coisa dessa.
 Lampião insistiu:
 - Ninguém vai saber disso...
 - Não descobre hoje, descobre amanhã. Não dá certo.
Ainda discutiram um pouco mais, até que o cangaceiro viu que não conseguiria munição de Ildefonso. Disse então que queria comprar do fazendeiro três rifles, um deles calibre 32, outro cruzeta papo amarelo e outro mauser. Ferraz respondeu:
 - Eu também não posso vender.
 Por fim, Lampião pediu que Ildefonso não mandasse, outra vez, dar retaguarda quando estivesse atacando os “cachorros de Nazaré”.

Nesse momento, Manoel Ferraz viu Ildefonso arregaçar a manga da camisa e, passando a mão sobre o braço, dizer com a voz nasalada que tinha:
 - O sangue da família de Nazaré corre aqui dentro destas veias. Eu quero que você não tente entrar em Nazaré. Se fizer isso eu estarei pronto para ajudar os nazarezistas.
Ouvindo aquilo - coisa que jamais esperaria ouvir -, Lampião tratou de sair. Havia um candeeiro pendurado num prego, na parede. Manoel Ferraz o pegou e se dirigiu a Lampião, que na ocasião estava com um chapéu de massa, de aba larga e que lhe sombreava o rosto. Num tom de brincadeira, disse:
 - Agora olhe para mim aqui que eu quero ficar lhe conhecendo direito porque pode ser que um dia você se revolte contra a gente e seja preciso eu dar um tiro de emboscada.
O bandido, nesse momento, fechou a cara, mas agüentou calado. Era-lhe conveniente. Com certeza jamais esqueceu a figura alongada de Manoel Ferraz que, naquela época, tanto se empenhou, bravamente, lutando contra os cangaceiros que infestavam a região.

José Goyanna conclui seu pensamento afirmando que Lampião “se transferiu para a Bahia e quando voltou a Pernambuco, depois de 1930, a primeira coisa que perguntou foi por Ildefonso. Ao saber que ele havia morrido, disse que foi bom porque “desta vez eu iria matá-lo.” Esta frase dita por Lampião justifica plenamente que jamais houve qualquer pacto entre o bandido e nossa família. Nem poderia ser de outra forma. Foi fantasiosa a afirmação do Sr. João Lira”, finaliza. Lampião, sem dúvida, respeitava a família Ferraz.

 Ildefonso Flor 
Morto por Virgulino em 1925 no combate de Xique-Xique.  

Um fato passado no Juazeiro do padre Cícero, na década de 1920, merece ser contado. Ali fora ter João Ferraz de Souza (irmão de Antônio Ferraz) levando um parente que buscava no padre o alívio para os seus males. O atendimento era coletivo. O padre aproximou-se e perguntou de onde vinham e a qual família pertenciam. Ao lhe responderem, observou, sendo ouvido por muitos:
 - A sua família tem condições de dar um jeito em Lampião, se assim o quiser.
Supersticioso como era, se tomou conhecimento daquelas palavras o bandido jamais esqueceu.

 O velho Antonio Gomes Jurubeba, pai do tenente João Gomes.

E o que diria Siato a respeito de sua inimizade com Lampião? Em seu livro “Memórias” e a Frederico Pernambucano de Mello contou que, em lombo de burro, em julho de 1917, dirigiu-se ao povoado de São Francisco. Viajava sozinho e armado com uma simples pistola comblain de dois canos (“dois tiros e uma carreira”). Ia receber uma mercadoria que ali fora deixada em poder de Manoel Lopes, primo da mãe de Virgulino, que se destinava a sua casa comercial. Apresentaram-lhe um fretador de nome José Ferreira, tendo na ocasião contratado o transporte das referidas mercadorias. Lembra-se Siato de que José Ferreira era “baixo, moreno, cabelo bom, maneiroso”.

“Assim combinado” - conta Siato -, “José Ferreira, acompanhado não me lembro bem se por dois ou três filhos, com os quais não cheguei a tomar conhecimento, pegou as aludidas mercadorias realmente no dia aprazado, entregando-as em Floresta, tudo em boa ordem. Nessa oportunidade fiz o devido pagamento do transporte e, todos nós satisfeitos, despachei-o, ficando na impressão de que se tratava de uma boa pessoa para tratos e negócios.”

Tempos depois os filhos de José Ferreira envolveram-se em confusões com José Saturnino e a família mudou-se para a fazenda Poço do Negro, pertinho de Nazaré. Ali estabelecido, José Ferreira passou a freqüentar o comércio de Floresta, onde sempre fazia negócios com Siato. Certa vez, Ferreira chegou a ser convidado a almoçar com o comerciante, aceitando. Com os filhos de José Ferreira, entretanto, Siato não teve contato mais estreito. Não se recordava mesmo de suas feições. Acreditava, entretanto, que Antônio, Virgulino e Levino, os três filhos mais velhos, deviam lhe conhecer pois costumavam acompanhar o pai, auxiliando-o no que era necessário.

Em Nazaré, onde chegaram com o apoio local, os filhos de José Ferreira logo se desentenderam com o pessoal da terra. Rompendo um tiroteio e Levino sendo ferido em um braço, foi preso e remetido para Floresta, onde ficou à disposição do delegado de polícia (1919).

Diz Siato:
- “Lembro-me bem que Levino, na cadeia, tendo me conhecido de vista em 1917, quando, com o pai, transportou as minhas mercadorias de São Francisco para Floresta, achou por bem mandar me pedir um metro de morim para amarrar o seu braço que continuava em tratamento e cujo pedido atendi.”
E acrescenta:
 - “Mandaria para qualquer um que pedisse para um fim desse.”
Siato não diz, mas Frederico Maciel deixa claro que, em Floresta, a família de Virgulino votou em pelo menos uma eleição com a família Ferraz. Talvez devido a isso, Antônio Boiadeiro e Antônio Ferraz, principais chefes políticos da família, procuraram resolver o problema da melhor maneira para as partes (os nazarenos eram seus parentes): fizeram um acordo em que a família Ferreira deveria deixar a região, sendo solto Levino. Assim saíram os Ferreira, fixando-se em Alagoas. Retirando-se às pressas, José Ferreira deixava um débito de 70 mil réis com Siato, valor pequeno para a época e, consequentemente, jamais cobrado à família ou a quem quer que seja.

Continua Fortunato em suas memórias: - “Virgulino, antes de se celebrizar com o nome de Lampião e pelo fato de me haver conhecido de vista em 1917 em São Francisco, achou por bem, quando já com um grupo de bandidos, escrever-me uma carta pedindo-me que eu lhe mandasse quatro caixas de balas de rifle e três cortes de brim mescla, a fim de fazer roupa para seus companheiros.

Nessa ocasião, chamei o portador da carta, o qual, aliás, não conhecia. Sabia que, se mandasse uma vez, depois ele pediria mais. Não queria me incompatibilizar com ele e nem com o governo. Disse então as seguintes palavras:
 - Diga ao Virgulino que recebi a carta dele pedindo-me quatro caixas de rifle e três cortes de brim mescla para os seus companheiros. Entretanto, queira lhe dizer que eu sou um comerciante principiante, e não tenho condições para atender ao seu pedido, sobretudo de balas de rifle, que representa material bélico que, certamente, me comprometeria perante as forças que o perseguem e ao próprio governo do Estado. Espero que ele saiba compreender.
Com essa minha resposta, conformou-se Virgulino por vários anos. Porém, anos depois, quando já cognominado Lampião e, como tal, célebre na sua vida, mandou-me um novo recado por um determinado portador (Joaquim Novaes, mais conhecido por Quinca Maneca - v. AFN, Ttn 15 - e que era empregado do major João Novaes), dizendo-me que eu lhe mandasse dinheiro sob pena de me dar maior prejuízo, inclusive ameaçando a minha própria vida.”

Siato pensou no que responder. A situação era delicada. Chamou depois Quinca Maneca e mandou dizer a Lampião que continuava na mesma maneira de se conduzir, acrescentando:
 - Não intervenho em negócios da luta dele, mas também não coopero em nada que ele pretenda nesse sentido porque também não quero me incompatibilizar com as forças.
 O recado foi levado. Lampião continuou espalhando que lhe daria prejuízo.
 “Assim fiquei eu aguardando os acontecimentos e sem poder viajar para qualquer parte, durante mais de um ano.

Entretanto, precisando estar em Recife com o meu sogro Nequinho Ferraz e sua família, no dia 4 de fevereiro de 1926 viajei em um carro que por ali passou com um senhor, fiscal de consumo, que vinha de Salgueiro com sua esposa. Ao passarmos na fazenda Caraíba, no alto Riacho do Navio, cerca de 100 quilômetros da cidade, ainda no município de Floresta, eis que ali se encontrava, no aludido riacho, já de emboscada em um serrote, o grupo de Lampião. Estava esperando a força da Polícia Militar, sob o comando do valente tenente Higino Belarmino, que vinha no rastro dos bandidos.

Nós, os viajantes, nada sabíamos dessa situação. Ao chegarmos na fazenda Jacaré, que fica a cerca de três quilômetros da Caraíba, ali encontramos um caminhão carregado de mercadorias. Vinha de Rio Branco (hoje Arcoverde) para Floresta e conduzia um grupo de tangerinos (sic) que voltava da feira de bois de Rio Branco. Entre eles vinha Joaquim Serafim (Joaquim “Grande”, cabra de Cassimiro Honório e grande amigo da família Ferraz), meu velho conhecido e amigo que residia ali próximo e que me chamando à parte, reservadamente, disse:
 - Seu Siato, por aqui?...
 - O que é que há? - Perguntei-lhe.
 - O Homem está por aqui - acrescentou - e eu acho que o senhor devia voltar daqui.
 Refletindo um pouco, perguntei onde estava ele. Respondeu:
 - Ontem, por volta das quatro horas da tarde, estava ele com o grupo ali na fazenda Volta e escreveu cartas para algumas pessoas daqui da zona, pedindo dinheiro. Eu acho que o senhor devia voltar.
 Nesse momento tive uma inspiração; assim como ele podia estar na minha frente, na travessia para Geritacó, poderia estar nas minhas costas.
 - Mais vale quem Deus ajuda. Eu vou para a frente, continuando com a minha viagem com fé em Deus.
Nesse mesmo momento chegava ali o carro com o meu sogro e família que havia ficado atrás e ao passar na fazenda Caraíba soube da notícia de Lampião e disse para mim:
 - Vamos embora que as coisas aqui não estão nada boas.
 Assim, partimos todos da fazenda Jacaré para o povoado de Geritacó, onde felizmente encontramos um cabo de polícia com 15 soldados, que nos tranquilizaram. Ali almoçamos.

Posteriormente, já no Recife, soubemos através de telegrama que, ao partirmos da fazenda Jacaré, começou o grande tiroteio da força do tenente Higino, que caiu na emboscada de Lampião na Caraíba, brigando durante sete horas, tendo a polícia perdido três soldados, saindo feridos outros sete, inclusive com ferimentos leves no próprio comandante e em Manuel Neto. Após o tiroteio, Lampião chegou à fazenda Jacaré, onde encontrou um outro caminhão carregado de mercadorias para Floresta.

Esse caminhão, entretanto, logo foi invadido pelo grupo que se apossou de tudo o que lhe agradava, inclusive de um fardo de tecidos, destinado a mim, constando de nove peças de mescla denominada “Legionária”, que a firma Moreira Lima & Cia. me havia enviado por cumprimento de autorização do seu então viajante de nome Manoel Campos, cujos tecidos foram todos distribuídos ao pessoal ali presente.

Passado o assalto do caminhão, continuando porém a invasão dos cangaceiros, o motorista ou dono do caminhão pediu ao chefe Lampião que fizesse os rapazes descerem do caminhão a fim de que pudesse refazer a necessária arrumação, sendo logo atendido, adiantando Lampião:
 - Agora tire o seu caminhão para fora daqui que ninguém mais tocará no mesmo.
 Nesse momento um mau elemento do grupo reconheceu a marca de alguns volumes meus e também uma mobília que eu havia comprado no Recife e avisou a Lampião, perguntando se queria que as queimasse.
 - Não - respondeu Lampião -, eu já disse que naquele caminhão ninguém mais bole.
 E assim passou em paz a minha mobília.

Entretanto, antes de três meses depois aconteceu um fato de maior prejuízo. No mês de abril de 1926 tive eu oportunidade de despachar para determinadas firmas compradoras de Gravatá e Recife, 30 volumes de peles de bode, couros de boi e algodão em pluma, servindo de portador o meu costumeiro freteiro, de nome José Marques. Ao regressar, porém, de Rio Branco, onde deixou a carga que levou, o meu freteiro carregou os burros com mercadorias não somente minhas como de vários outros colegas comerciantes de nossa cidade, voltando para Floresta. Ao chegar à fazenda denominada Barra da Serra, arriou o seu comboio para pernoitar.

Aconteceu que, por volta da meia noite, inesperadamente, ali chegou Lampião com o seu grupo de 25 cabras, todos devidamente montados a cavalo ou burro e logo se dirigiu ao freteiro José Marques, dizendo:
 - Esse comboio é do Siato, não é?
 Ao responder o freteiro que não era meu, replicou Lampião:
 - Não negue, porque assim vai morrer...
 - Para falar a verdade, seu capitão, aqui vem algumas mercadorias de seu Siato, mas a maior parte é de outros comerciantes de Floresta.
 - Não quero saber de mais conversa - disse Lampião, voltando-se para o grupo -, queima tudo.
E logo trataram os cabras de arranjar o que se fazia preciso, dando início à queima, até quando começaram a estourar balas de pistola “mauser”, que vinham junto com as mercadorias de um dos meus colegas. Nesse momento Lampião deu ordem para que apagassem o fogo e catassem as balas, como realmente aconteceu. A seguir, Lampião encontrou um dos burros do pobre matuto e logo o pegou e o deu a um dos cabras que vinha mal montado.

Dali, Lampião seguiu sua marcha e antes do amanhecer assaltou o povoado de Algodões, onde se encontravam alguns soldados doentes de sezão (malária) e que voltavam da zona então perigosa do rio São Francisco para o Recife. Esses soldados deram alguns tiros contra o grupo, mas em seguida se retiraram do povoado. Daí em diante o grupo, tomando conta do povoado, praticou, segundo foi sabido, toda sorte de roubos e misérias que não se pode nem se deve descrever, retirando-se em seguida calmamente, sem nada sofrer, tomando o destino que bem quis. Foi sempre assim a marcha do hediondo malfeitor.” O ataque a Algodões se deu a 20.04.1926, segundo Billy Chandler.

Chegando ao Recife, Siato foi avisado por telegrama que Lampião declarara que estaria a sua espera, na volta a Floresta. Era recomendável seu regresso por Alagoas. Antônio de Sá Leal, primo de Siato, convidou-o para ir ao Palácio e falar com o governador Sérgio Loreto, de quem era amigo, para pedir-lhe garantias. Diz em suas Memórias: - “Não obstante esse convite, desisti do mesmo pois não confiava em promessas ou providências por parte do governador, já que o mesmo era parente e amigo do Comandante da Polícia do Estado, o C.el João Nunes, a quem ouvia para tudo, só decidindo de acordo com o pensamento daquele Comandante.

E nós sabíamos que o C.el João Nunes mantinha má vontade para Floresta, pois havia alguns anos fora assassinado naquela cidade um seu irmão, de nome Manoel Nunes, que ali exercia as funções de anspeçada de polícia e não correspondeu no cargo.” O anspeçada tinha desfeiteado um rapaz da família Carvalho, sendo por esse motivo assassinado.

Ficou Siato aguardando o resultado da entrevista do primo Sá Leal com o governador, da qual resultou apenas o envio de um tenente ou capitão da polícia “que não dispunha da indispensável idoneidade para a missão.” Acompanhado de apenas 12 soldados, seguiu para dar combate a Lampião. Vendo a partida, Siato fez ver a Sá Leal que aquela força não faria Lampião deixar a região. O primo então voltou ao governador e este colocou à disposição de Siato um caminhão com 10 soldados para escoltá-lo de Arcoverde para Floresta. Sabendo disso, Siato não aceitou a oferta. E conta: - “Nessa situação, declarei ao primo Sá Leal que podia dizer ao governador que eu ia mandar sustar o despacho (para Floresta) das mercadorias que havia comprado, em virtude de não ter garantias para o seu necessário transporte de Rio Branco para Floresta.

Um oficial com 10 soldados em um caminhão, num caso de um assalto de Lampião, nem mesmo aquela força poderia resistir, senão por pouco tempo, e o resultado seria a debandada da pequena força, deixando-me para ser fuzilado com minha própria esposa.

Em semelhante situação, resolvi regressar para Floresta por Alagoas.” Mais adiante, conta Siato: - “Lampião, no começo de setembro de 1926, achou por bem visitar algumas cidades do nosso Sertão, começando por Cabrobó.” A invasão se deu a 02.09.1926.

Dali “regressou Lampião, visitando também o nosso povoado de Itacuruba, distante cerca de 40 quilômetros de Floresta. Ali chegando, querendo arranjar uns dois bornais e encontrando uma costureira ao lado de sua máquina, logo a solicitou para costurar, sendo delicadamente atendido pela costureira, que era professora estadual. Essa professora era minha prima carnal, Maria Pina (mais tarde esposa do meu outro primo, Euclides Ferraz), que se achava em casa do seu mano Fausto Gomes de Sá Filho, conhecido e tratado por Faustinho. Os dois logo ficaram apavorados por saberem da minha incompatibilidade com Lampião, mas felizmente desse assunto ninguém tratou.” Era o dia 16.09.26.

Dali seguiu Lampião na direção de Tacaratu, indo dormir, no dia 17, na fazenda Tigre (Floresta), onde foi atacado no dia seguinte pelas forças aquarteladas em Floresta. Foi então ferido no peito ou no ombro, indo tratar-se “na serra do Preá”, em Tacaratu. Depois de reestabelecido, atravessou novamente o município de Floresta onde, na fazenda Juá, encontrou uma grande boiada pertencente ao fazendeiro e boiadeiro Joaquim de Alencar Jardim (irmão de Antônio Boiadeiro e tio da mulher de Siato).

Lampião “deu ordem a seu grupo para matar toda a boiada, a tiros. Terminada a matança, disse para as pessoas que ali chegavam que não admitia que ninguém aproveitasse a carne da boiada morta.” Este fato se deu a 12 de dezembro de 1926. Estava, portanto, bem claro que não havia acordo ou pacto com a família Ferraz.

Em junho de 1927, Lampião atacou Mossoró, perdendo aí grande número de companheiros. Fugiu para o Ceará, onde foi recebido com hostilidade e viu outros cabras debandarem. A perseguição tornou-se insuportável para o bandido, que passou a contar com 4 a 6 cabras. “E foi com esse reduzido grupo que Lampião resolveu atravessar o rio São Francisco e galgar o Estado da Bahia, onde após alguns anos se refez, infelizmente”, diz Fortunato Gominho.

Depois de contar outras façanhas de Lampião, Siato conclui: “Estas, finalmente, são as minhas lembranças do banditismo nos sertões do Nordeste e de como Lampião se tornou inimigo do modesto rabiscador destas despretensiosas memórias.” Em nenhum momento deixa transparecer ter havido qualquer acordo, ou que o bandido tenha deixado de ser seu inimigo.

Ao autor, contou uma conversa que teve com Emiliano Novaes. Fora procurado quando se encontrava trabalhando em sua loja. Era pleno dia e não a calada da noite, que foi quando Lampião esteve em Floresta.

Nessa conversa, Emiliano disse a Siato que a partir daquele dia ele poderia dormir em plena rua. Lampião não lhe causaria qualquer mal. O problema havia sido resolvido por ele, Emiliano. O comerciante, ouvindo aquilo, disse que “continuaria dormindo dentro de casa”. Emiliano adiantou: o cangaceiro estava precisando de munição e lhe pedia a colaboração. Somente então Siato compreendeu que se tratava de mais um pedido de Lampião. Indignado, disse a Emiliano que se o preço para não ser molestado era aquele, podia dizer a Lampião que “nada tinha para lhe mandar”. Preferia mesmo retirar-se de Floresta a continuar ali em semelhante situação.

Foi, talvez, nessa época, que resolveu comprar doze rifles e muita munição.
 - “Ele pode entrar aqui depois de gastar muita munição e nós acabarmos a nossa munição, mas nós reagiremos até a última hora”, disse.
E mandou abrir várias “torneiras” no sótão de sua casa comercial e no muro, por trás de sua residência. À família, sempre declarou sua “incompatibilidade” com o bandido, que durou enquanto o cangaceiro foi vivo. A relativa tranquilidade veio somente com a ida de Lampião para a Bahia, onde fixou seu novo centro de operações.

Quanto a João Gominho Filho (Joãozinho Gominho), que ganhou de um soldado de volante um cachorro a quem chamava Lampião, ousou conservar-lhe o nome. A rixa que lhe tinha o famoso cangaceiro, entretanto, era bem mais em decorrência de sua atitude em relação aos nazarenos, como bem esclarece Marilourdes Ferraz (O Canto do Acauã, 2 ed., p. 219): - “Pode-se afirmar que a resistência do povoado, no começo, pôde ser efetuada com a ajuda de um florestano, jovem e idealista, que comerciava em Nazaré: João Gominho Filho.

Este homem, vendo um ataque arrasador contra a localidade e seus habitantes, passou a auxiliá-los na tarefa defensiva, efetuando o intercâmbio de armas: recolhia-as de algumas fazendas e as transportava para as mais visadas pelo bando, escondidas entre suas mercadorias. Dessa forma, prestou um grande benefício aos moradores de Nazaré e arriscou, na mesma intensidade, a sua vida.”

Numa certa ocasião (1926) os nazarenos lutaram numa mesma semana com os revoltosos (Coluna Prestes) e com o grupo de Lampião. Seus estoques de munição reduziram-se a duas balas de rifle. Naquela situação aflitiva João Flor escreveu uma carta para Joãozinho Gominho, pedindo auxílio. Este correu o comércio, obtendo ajuda apenas de duas pessoas: Siato e Antônio Ferraz de Souza, então chefe político da família Ferraz. Siato deu uma caixa de balas e Antônio Ferraz duas. A estas, Joãozinho juntou outras duas, dadas por ele, e fez chegar às mãos de João Flor. Eram 250 balas que “foram recebidas como se fossem 10 mil”, tal o desespero em que se encontravam, na iminência de serem atacados por Lampião, não podendo se defender daquela forma.

Com o serviço de informações que tinha, o bandido, com certeza, tivera conhecimento do trabalho de Joãozinho Gominho. Daí seu grande ódio a essa família. Joãozinho era bastante ligado ao pessoal de Nazaré. Para ali levara, por duas vezes, a Banda Musical de Floresta, sem qualquer ônus para o povo do local, para animar as festividades da padroeira.

Capítulo de seu livro "Floresta uma Terra - um Povo", 1996, editora: Fiam.

1ª imagem e maiores informações vocês localizam no essencial site Genealogia pernambucana
As demais foram inseridas por nós para ilustrar a  matéria.

sexta-feira, 30 de julho de 2010

Cruzando peixeira

Entrevista com Antonio Vilela 

O professor Antonio Vilela lançou seu segundo livro abordando as histórias do tempo de Lampião, trata-se do "O Incrível Mundo do Cangaço - Volume II". 

Foto: coronel Severo
Antes do aludido lançamento, precisamente dia 31 de Março, o Blog do Ronaldo César esteve na residência do autor que lhes deu a oportunidade de viajar pela história, através de um impressionante arquivo fotográfico dos personagens das Volantes e dos grupos de cangaceiros. Sempre atencioso e de uma gentileza ímpar, o autor num bate papo descontraído nos concedeu uma entrevista marcante, principalmente pela sua memória histórica e a narrativa dos fatos.

O Senhor é natural de Garanhuns?
E- Não, eu nasci em São João em 12 de Junho de 1953, quando estava com 3 anos quando meus pais vieram residir nesta cidade, me considero filho adotivo de Garanhuns.

Quando nasceu essa paixão pela História do Cangaço?
E- Essa paixão nasceu quando eu era menino, através de uma vizinha, moradora da Vila do Quartel, chamada dona Mocinha. (Ela sempre corria atrás da gente quando estávamos jogando bola em frente a sua casa (risos), mas nos momentos de paz ela contava pra mim as história de Lampião, dona Mocinha era sertaneja e por coincidência rendeira). Somando a isso, quando fui estudar no ENA em Belém de Maria conheci a minha esposa Maria da Paz, nascida em Mossoró. Em 1975 quando fomos morar na cidade natal da minha esposa, a residência da minha sogra ficava próxima à cadeia onde ficou preso o cangaceiro Jararaca, o que me levou a iniciar as pesquisas sobre o cangaço, pois naquela cidade se deu um dos famosos ataques do bando do Capitão Virgulino.

Quando decidiu escrever o Livro O Incrível Mundo do Cangaço?
E- Após trinta e um anos de pesquisas, seguindo a trilha do cangaço, com vários documentos e fotografias históricas meu filho Hans Lincoln me incentivou para escrever, era 2003, e o livro acabou editado em 2006. Confesso que ao concluí-lo fiquei surpreendido com o resultado. O livro já está em sua 3ª Edição num total de cinco mil livros vendidos, em breve estarei lançando "O Incrível Mundo do Cangaço - volume dois".

O livro teve uma grande repercussão, não apenas pela sua vendagem, mas pelas suas riquezas de detalhes ao descrever e narrar o cangaceirismo. Como foi visto essa obra pela mídia falada e escrita do nordeste?
E- Tanto na mídia escrita e falada o livro recebeu inúmeros elogios, sendo publicadas várias reportagens em jornais, como o Jornal do Comércio,. Folha de Pernambuco, O Mossorense, Diário de Pernambuco onde assessorei a edição especial na Trilha do Cangaço em comemoração aos 70 anos da morte de Lampião, nas revistas "Terra da Gente" da Editora Globo, NE 21, Revista Cultural e tive a oportunidade de participar de programas de TV, entre eles, NE TV, Conversa na madrugada com Aldo Vilela, Globo News, Record Internacional, TV Diário, TV Assembleia, sempre participando de entrevistas ou documentários, e aguardando calendário para participação no programa do Jô.

Atualmente o senhor é uma referencia para quem pesquisa ou tem curiosidade em ler sobre o Cangaço. Como é a sua relação com os demais historiadores do Cangaço?
E- É uma confraria, sempre estamos nos reunindo, participando de fóruns, palestras, lançamentos, trocando informações. Hoje sempre estou tendo contato com o Potiguar Paulo Gastão, o paulista Antonio Amaury e Frederico Pernambucano, grandes nomes do estudo do cangaço.

O que diferencia "O Incrível Mundo do Cangaço" de outros livros já publicados sobre o tema?
E - O Incrível Mundo do Cangaço quebra o paradigma de Lampião e Sertão, como se o cangaço só tivesse ocorrido nessa região, o meu trabalho focaliza o cangaço no Agreste, destacando nomes até então pouco comentados em algumas obras, como José Abílio, Paisinho Baio, Capitão Américo, tenente Caçula, Zé Jardim, Audálio Tenório, Gerson Maranhão, coronel João Nunes, entre outros.

O Senhor faz parte de alguma Associação do Cangaço?
E- Sou filiado, desde 10 de Novembro de 2006 à SBEC - Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço, que reúne os maiores historiadores do cangaço do Brasil. Recebi meu diploma de filiação em Serra Talhada, onde nasceu Lampião.

Naturalmente em suas pesquisas o Senhor entrevistou ex-cangaceiros, ex-cangaceiras e ex-integrantes das volantes. O Senhor poderia nos citar alguns desses entrevistados e qual foi o momento mais emocionante nesse trabalho?
E- Conheci oito cangaceiros, três faleceram: Sila, Adília e Durvinha. Estão vivos: Moreno, Dulce, Vinte e Cinco, Candeeiro e Aristeia. Da volante conheci tenente João Gomes de Lira, Sargento Antonio Vieira, Neco de Pautila, cabo Grilo, Sargento Teophilo Pinto e a da família de Lampião, sua filha Expedita que reside em Aracaju e Maria Ferreira Queiroz (dona mocinha) irmã de Lampião, que reside em São Paulo. O momento mais emocionante foi a amizade e as conversas que eu tive com Durvinha, ela foi casada com o cangaceiro Virgínio, cunhado de Lampião. Ela me dizia que ele era bom, que a única maldade que fez foi capar um macaco (soldado da volante), quando estava em Patos de Minas, em viagem para o Paraguai, acompanhado do escritor João de Sousa Lima. Quando resolvi ligar para saber de Durvinha, pois estava a 400 quilômetros da sua cidade, quem atendeu foi sua filha Neli, aos gritos, e desligou, Depois Nelí retornou a ligação informando, para minha tristeza, que Durvinha havia falecido naquele instante.

  
 Ocasião em que Vilela entrevistou o ex cangaceiro Vinte e cinco.

O Senhor já está trabalhando em outro projeto? O que os seus leitores podem esperar desta nova publicação?
E- Estou em fase de edição focalizando neste trabalho o Cangaço no Agreste Pernambucano, trazendo neste livro 90 por cento de fotos inéditas.

O Senhor escreve em alguns jornais de Garanhuns, sempre resgatando a História da cidade, existe algum projeto de publicar algo neste sentido?
E- Esporadicamente escrevo para o Correio Sete Colinas e realmente pretendo daqui a cinco ou seis anos publicar livro de memórias de Garanhuns, cujo título será Garanhuns, Seu Povo e Sua História.

Como está a agenda neste ano de 2010?
E- De 08 à 10 de Junho estarei participando do XIX Fórum do Cangaço de Mossoró, o qual fui convidado para fazer uma palestra sobre a Historiografia do Cangaço. De 17 a 22 de agosto estarei participando do II Carriri Cangaço no Crato, Juazeiro, Missão Velha, Barbalha, Porteiras e Aurora, onde farei palestras sobre o Cangaço no Agreste pernambucano. No dia 28 de Julho estarei em Angicos e Poço Redondo, onde Lampião foi morto. E estou aguardando a confirmação para viajar a Munique, onde farei uma palestra para a comunidade nordestina, iniciativa da doutora Fátima, garanhuense que reside naquela cidade alemã.

Em relação à literatura em Garanhuns, o que poderia ser feito para dar oportunidade aos nossos escritores?
E- O incentivo do poder público custeando as edições dos livros.

(Entrevista concedida a Cláudio Gonçalves de Lima)

 
Este é o novo trabalho do confrade Vilela.



Contatos com Antonio Vilela:
(87) 3763 5947 / 8811 1499
incrivelmundo@hotmail.com

Açude: Blog do Ronaldo César

Lampião Aceso informa: 
CARIRI CANGAÇO 2
Domingo, 22 Agosto 2010
09:00 H no Teatro Marquize Branca – Juazeiro do Norte
"Lampião no Agreste Pernambucano"
Proferida por Antonio Vilela

"Rio Preto"

A revolta extrema de um negro humilhado 

Por: José Romero Araújo Cardoso (*)

Luiz era seu nome de batismo, mas foi imortalizado tragicamente nas crônicas da violência do século dezenove pelo apelido cangaceiro de Rio Preto. Não tinha bando próprio, agia sozinho, pois preferiu destilar seu ódio solitário pelas quebradas do sertão.

Luiz nasceu em Pombal (PB), foi criado, melhor dizer acolhido na humilhação extrema, pelo sacerdote católico Amâncio Leite, que não poupou em nenhum momento o pobre Luiz das mais vexatórias e ignominiosas manifestações de escárnio visando massagear ego doentio condicionado pelo histórico racismo que marca o imaginário de pessoas sem formação e detentor de falsa devoção a Deus, que não difere negros, brancos, amarelos ou vermelhos.

Não seria de estranhar que nêgo Luiz despertasse revolta incontida contra a sociedade de sua época. Ganhou as caatingas sertanejas feito fera bravia sem limites para a violência que disseminou.

Sequestrava mocinhas brancas, seviciava-as e depois de torturá-las ao extremo, reservava-lhes morte cruel e desumana. O covil no qual se homiziava era cheio de ossos dessas infelizes que tiveram a desdita de cair em suas garras tenebrosas.

Imitava com invulgar perfeição o rincho de um jumento, razão pela qual o terror era instalado no coração das pessoas quando ouviam o som estridente do animal que conduziu Jesus quando da fuga para o Egito, fugindo das perseguições romanas impostas por Herodes.

Rio Preto foi um cangaceiro semelhante a Lucas da Feira, cuja perversidade marcou época na Bahia. O modus operandi de ambos foi marcado pela ferocidade como agiam, pela forma como extravasou o ódio contra as estruturas da sociedade de suas épocas.

Diziam que Rio Preto tinha feito pacto com o demônio, pois se propalou que o cangaceiro era imune a facas e balas, nada o atingia, pois além de tudo era dotado de "encantamentos", transformando-se em tocos ou pedras quando alguma força volante estava em diligência a fim de capturá-lo.

Rio Preto tinha inúmeras mortes nas costas, era o terror de Pombal (PB) e áreas fronteiriças das Províncias Parahybana e norte-riograndense. A ira implacável de nêgo Luiz fez muitos sertanejos tremerem de medo durante décadas.

Afirmo categoricamente que o responsável pela gênese do malvado cangaceiro paraibano foi o Padre Amâncio Leite. Esse foi o principal responsável pelo terror instalado no sertão devido a forma extremamente perversa como tratou a criança desde a mais tenra idade, infringindo-lhe castigos terríveis que forjaram a personalidade doentia e criminosa de Rio Preto.

Mas nêgo Luiz não tinha o corpo fechado como se dizia. Responsável pela morte de um fazendeiro em Pombal (PB), Rio Preto foi alvo de uma tocaia montada pelos filhos do sertanejo assassinado. Chovia aos tântaros quando os adolescentes escalaram os clavinotes em direção ao cangaceiro. Haviam colocado algodão nas agulhas das armas, para facilitar os disparos na enxurrada.

A fama de mau de Rio Preto era tão conhecida que os dois rapazes não esperaram para constatar se havia consumado a vingança. Mas Rio Preto resistiu com estoicismo aos disparos, sendo encontrado por forças policiais estertorando. Conduzido à cadeia de Pombal (Foto abaixo), considerada a mais segura do sertão setentrional, Rio Preto faleceu em uma das celas, morrendo sem se arrepender dos crimes abomináveis que cometeu em suas estrepolias violentas pelas veredas da terra do sol.


(*) José Romero Araújo Cardoso. Geógrafo. Professor-adjunto do Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Especialista em geografia e Gestão Territorial e em Organização de Arquivos. Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente. Membro do Instituto do Oeste Potiguar (ICOP). Contato: romero.cardoso@gmail.com.

quinta-feira, 29 de julho de 2010

Canudos

"Guerra de Deus e do diabo

Este é um vídeo didático elaborado pela "Fundação Joaquim Nabuco" e Pelo "Ministério da Cultura", com o apoio da "TV Cultura". É um dos episódios da Série "Brasil - 500 Anos" (disponível no site: www.dominiopublico.gov.br), falando sobre o Conflito armado entre sertanejos sem-terras e as forças da República (1893 a 1897). Os sertanejos esperavam a vinda do Reino do Rei Dom Sebastião: um reino onde todos seriam igual socialmente - de glória e justiça para todos.

Novo livro na praça

O Massilon de Honório Medeiros 

Por Kydelmir Dantas (*)


Quando da realização do XI Fórum do Cangaço, promovido pela SBEC (Mossoró – 2008) o Professor Doutor Honório de Medeiros já nos abrilhantava com uma palestra sobre este personagem, importante na história do ataque de Lampião e seus cabras a Mossoró, sob o título: Quem foi Massilon?

Neste ínterim já se referia a uma ‘nova onda do cangaço’, surgida a partir do momento em que os focos dos pesquisadores deixaram de ser apenas o cangaceiro Lampião, mas viraram-se para os demais componentes e/ou participantes deste fenômeno sócio cultural do Nordeste brasileiro, o Cangaço.

Algumas pessoas desavisadas, quando se fala no tema, acham que cangaço é apenas a imagem do que foi Lampião – herói, pra seus amigos, e bandido, para seus inimigos e vítimas – e o que é – o mito criado e pesquisado na atualidade. Esquecem que o cangaço foi uma moeda de duas faces: De um lado, os cangaceiros, coronéis e coiteiros; d’outro, as forças legais, representadas pelas Polícias estaduais, as volantes e, também, os coronéis.

Em verdade, Honório de Medeiros não foi o primeiro a desviar sua pesquisa para um personagem secundário (?) da história do cangaço - outros nomes já foram estudados e apresentados - mas foi, com certeza, o que mais aprofundou-se na vida de Massilon Leite, considerado um dos mentores do assalto a Mossoró, juntamente com o Coronel Isaías Arruda, de Aurora – CE.

Em seu livro, “Massilon (Nas veredas do Cangaço e outros temas afins)”, Honório apresenta o resultado de uma pesquisa séria e de longo percurso, com mais de seis anos, nas pegadas deste homem. Antes, porém, imprime suas pegadas memoriais no início do século XX, vislumbrando o Rio Grande do Norte, Mossoró e o Sertão daqueles tempos. A partir deste viés, passa a acompanhar os passos do vaqueiro, comprador e vendedor de reses, desde o seu nascimento, ‘provavelmente em Timbaúba dos Mocós – PE’, segundo o autor, até sua morte, em Caxias – MA, no ano de 1928.

Além disto, que é o tema principal do mesmo, o livro traz dados, datas, fatos e informações sobre personagens e temas correlatos à ‘Resistência de Mossoró’ ao ataque dos cangaceiros comandados pelo ‘capitão Virgolino Lampião’, como este se assinou no bilhete escrito de próprio punho e enviado ao Prefeito Rodolpho Fernandes, naquele dia fatídico para Lampião e seus bandidos, 13 de junho, e vitorioso para Mossoró e seus dignos cidadãos e heróis da resistência, naquela tarde de uma segunda-feira de 1927.

Com mais este trabalho, a bibliografia cangaceira ganha um livro de peso, de um pesquisador que dignifica e faz parte da ‘Nova Onda do Cangaço’, que é mostrar e deixar para as novas e futuras gerações o registro sério de nossa História. Que outro(a)s apareçam e façam o mesmo. Com as nossas saudações Sbequianas!


(*) Kydelmir Dantas é Poeta, pesquisador e escritor de temas ligados ao Nordeste brasileiro; de Nova Floresta – PB, radicado em Mossoró – RN. Sócio-fundador da SBEC. 

Serviço:



Não vai ao 2º Cariri Cangaço, mas deseja adquirir o livro:
Livraria Poty
Rua Felipe Camarão, 609 - Centro - Natal (RN)
(84) 3203-2626 

Pesquei no Blog da: SBEC

quarta-feira, 28 de julho de 2010

E aí meu cumpadi

Já se inscreveu para o Cariri Cangaço?
 

Prezados amigos;

As Inscrições para o Cariri Cangaço 2010 estão abertas, e este ano será muito mais fácil participar, não precisa preencher Ficha, basta nos enviar um email para o endereço: fichacariricang@hotmail.com 
Com os dados abaixo:
NOME
TELEFONE
ENDEREÇO
EMAIL
ATIVIDADE PROFISIONAL

Pronto! Já está inscrito para um dos maiores eventos do Cangaço no Brasil!
Seja bem vindo, faça já a sua Inscrição.

CONHEÇA O CARIRI CANGAÇO:

Cariri Cangaço - Coronéis, Beatos e Cangaceiros, evento de cunho turístico-cultural e científico; em sua edição 2010, acontecerá na Região do Cariri, sul do estado do Ceará, tendo como cidades anfitriãs: Crato, Juazeiro do Norte, Barbalha, Missão Velha, Aurora e Porteiras. Reunirá a partir de uma programação plural, dinâmica e universal, personalidades locais, regionais e nacionais; do universo da pesquisa e estudo das temáticas ligadas ao Cangaço, Tradições e Histórias do Nordeste. Até o presente momento temos a confirmação de 86 personalidades, entre: pesquisadores, escritores, professores de várias áreas, artistas, cineastas, documentaristas, fotógrafos, jornalistas, enfim.

O Evento em sua segunda edição terá um conjunto de 16 conferências, seguidas de debates, abordando temáticas ligadas à historiografia nordestina (sub temas: Coronéis, Beatos e Cangaceiros); distribuídas durante o período de realização do mesmo; 6 dias ; nos 6 municípios anfitriões. Os conferencistas são pesquisadores, estudiosos, escritores e professores, de renome nacional.

A partir da Universidade Regional do Cariri - URCA; parceira do evento; o Cariri Cangaço - Coronéis, Beatos e Cangaceiros, estará promovendo também um grande Painel de apresentação de Trabalhos Acadêmicos, de participantes de todo o Brasil, sobre a temática do encontro.

Será apresentada a II Mostra Cariri Cangaço de Cinema, Vídeo e Documentários, possibilitando aos participantes uma maior interação com a temática a partir dos trabalhos apresentados.

Teremos a II Latada do Livro Cariri Cangaço, onde os participantes terão a oportunidade de entrar em contato com as principais obras literárias sobre a temática.

Teremos o II Grande Salão Cariri Cangaço, onde serão lançadas 8 novas obras literárias sobre a temática; de autores de todo o Nordeste e também São Paulo.

Teremos distribuídas nos seis dias de evento, 17 Apresentações Artísticas, com as mais significativas manifestações culturais e folclóricas de toda região do Cariri, das áreas das Artes Cênicas, Música e Cultura Popular.

Em sua primeira edição, o Cariri Cangaço-2009, reuniu 79 personalidades do universo da pesquisa e estudo das temáticas ligadas ao nordeste e ao cangaço; recebemos no cariri cearense 197 participantes de 12 estados da federação; Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia, Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo e Distrito Federal; além dos mais 1.500 participantes dos municípios promotores. Durante seis dias no ano de 2009; entre 22 e 27 de setembro, foram realizadas 19 Conferências, seguidas de debates, 21 Visitas Técnicas e 23 Apresentações Artísticas. Foram inauguradas a I Mostra de Cinema e Vídeo Cariri Cangaço, como também foi lançada a I Latada do Livro Cariri Cangaço, tivemos ainda o lançamento de 6 novos livros de escritores dos estados de Pernambuco, Ceará, Distrito Federal e Minas Gerais

O Cariri Cangaço é uma promoção da Cariri do Brasil, uma realização das prefeituras municipais de Crato, Juazeiro do Norte, Barbalha, Missão Velha e Aurora, URCA/PROEX e ainda o apoio da SBEC, do ICC, do Centro Pró Memória, do ICVC, da Fundação Memorial Padre Cícero, da Associação de Cordelista de Crato, do Ponto de Cultura Lira Nordestina, do SEBRAE, do SESC e do Centro Cultural Banco do Nordeste, Geo Park Araripe , Grupo Empresarial Guanabara e Revista Nordeste VinteUM.

Maiores Informações visite nosso Site: www.cariricangaco.com
Produção Cariri Cangaço 
 Manoel Severo 
Curador e Coordenador do evento

Exposição cangaceiros em Fortaleza

 Matéria da TV Ceará



Opinião

28 de Julho 2010, 72 anos de culto ao herói errado

por Luiz Berto

Uma simbiose perfeita entre o homem e a natureza oferece, atualmente, um espetáculo fulgurante às cidades de Piranhas (Alagoas) e Canindé do São Francisco (Sergipe) com belíssimas paisagens, exóticas formações rochosas, águas cristalinas, trilhas ecológicas; e, sobretudo, uma singularidade ímpar de vegetação diferenciadamente exuberante e diversificada fauna.

Navegando pelo Velho Chico (aquele da “unidade nacional”), mais ao sul do lado sergipano entre cânions e rochas, ninhais de garças, praias fluviais e ilhas flutuantes, encontramos o município de Poço Redondo, na antiga região de campo-santo do Morgado do Porto da Folha; e, mais precisamente, após uma trilha de aproximadamente meio quilômetro, nos deparemos com a histórica Grota do Angico.

Tal Grota testemunhou, há exatos 72 anos, a derrocada do “Cangaço” quando da morte de Lampião, Maria Bonita e mais nove cangaceiros. Tal empreitada foi comandada pelo célebre, e historicamente esquecido, comandante das “Volantes”, Tenente João Bezerra da Silva (Foto), da Polícia Militar de Alagoas, na manhã da quinta-feira 28 de julho de 1938.

Entendendo-se o Cangaço como hordas de bandoleiros e salteadores que aterrorizavam as cidades e povoados da região, marcadas pelo medo, pânico, pavor, terror e desmedida violência. Entendendo-se, por outro lado, as Volantes como forças policiais surgidas na década de 1920, itinerantes e de rápido emprego tático em ações no interior dos enfeudados sertões do nordeste “sub-saariano” brasileiro e criadas para combaterem este fenômeno fora-da-lei; poderemos conhecer o real significado do acontecimento, ora em transcurso, para estas ordeiras e honestas comunidades sequiosas de desenvolvimento e melhor qualidade de vida.

Contudo, não devemos nos esquecer que, na gênese do cangaço, mormente sua atividade criminosa e não justificada, manifestava-se uma forte reação social ao obtuso poder central, ao descaso dos políticos regionais e aos “coronéis de terra”, responsáveis pela miséria, trabalho servil e pelo abandono das populações interioranas da região Nordeste do Brasil.

Portanto, em vez de se querer “endeusar”, “martirizar” ou “canonizar” a figura de um bandido; conclamamos que seja feita uma revisão histórica dos fatos, atos e personagens envolvidos nos episódios em pauta. Talvez, se conhecêssemos melhor o verdadeiro papel das Polícias Militares (Força Pública ou Brigada Militar, à época) - em particular - as Forças Volantes; e, mais ainda, a trajetória policial-militar do Coronel Bezerra (então Tenente); talvez, não se cultuassem facínoras ou heróis errados de todos os matizes.


João Bezerra sentado fila de baixo, é o sétimo da esquerda para a direita.


O texto é de 2008. Atualizamos a data até porque todos hão de convir que Lampião é sempre atemporal.

Pesquei no :Besta Fubana

domingo, 25 de julho de 2010

Bravos Florestanos

Coronel Bráulio Ferraz 

Por: Leonardo Ferraz Gominho (*)


Os revoltosos

Manoel Quincas de Souza Ferraz residia na Mata dos Angicos, fazenda que construíra na ribeira do Mandantes e onde moraria até o ano de 1940, quando se mudaria para o Poço das Baraúnas. Esta última fazenda já era, então, embrionária. Ali, num certo dia de fevereiro de 1926, estava o proprietário, acompanhado do filho Bráulio, quando obteve notícias de que elementos da Coluna Prestes tinham invadido a fazenda de Totoinho Ferraz, no Poço Novo, a três quilômetros dali.

Os revoltosos, tudo indicava, marchavam na direção da Mata dos Angicos. Manoel necessitava permanecer no Poço das Baraúnas por algum tempo. Instruiu o filho: deveria ir à Mata dos Angicos avisar Mariinha.
                                                                                                 
  Manoel Quincas e sua esposa Maria Gomes Ferraz.

E recomendou: deveria ocultar o cavalo atrás da roça e, a pé, aproximar-se cautelosamente da casa. Se os revoltosos não se encontrassem ali, avisaria sua mãe para não abandonar a casa. Explicou que os componentes da Coluna não eram celerados; tratava-se de gente civilizada, conduzida por idealistas. Deveria, entretanto, soltar e espantar todos os animais da fazenda. Mandou que escondesse os arreios de montaria pois a Coluna necessitava de cavalos e material de sela para continuar sua marcha. Mandou o filho seguir rápido. Logo iria estar com eles.

Bráulio foi encontrar a fazenda sem qualquer anormalidade. Sua mãe terminava de banhar o pequeno Humberto (filho de Benício Ferraz) quando recebeu o recado. Ainda que a notícia tenha sido dada sem alvoroço, Mariinha, incontinente, envolveu o neto numa toalha de banho e bradou aflita:
 - Vamos embora, depressa! Os revoltosos vem aí!
De nada valeram as recomendações do chefe da família. Mariinha, ao lado das filhas, partiu imediatamente para o Poço das Baraúnas; Preta - que adotara assim que casou - ajudava no que podia. Bráulio e o primo Elpídio Ferraz - outro que passou a morar com Manoel Quincas ainda adolescente, com cerca de 14 anos de idade - trataram de retirar da casa o que tinha de mais vulnerável: selas e arreios, malas com roupas, tudo foi escondido às pressas.
Com receio de que as mulheres, naquele alvoroço, viessem a se atirar nas águas do Mandantes, represadas pelo açude, Elpídio pediu para que Bráulio alcançasse a mãe e prevenisse quanto à imprudência. Ele, sozinho, completaria o trabalho iniciado.

Depois de espantados os animais, Elpídio presenciou a chegada dos elementos da Coluna. Entraram na casa e reviraram tudo. Levaram uma sela e uma corda de laçar, que ali haviam ficado. Espalharam pelo chão a correspondência de Manoel Quincas, quase toda relacionada com os negócios de compra e venda de bois.

Também jogaram no chão alguns exemplares de jornais. Entre eles, e dentro de um velho calçado que estava sob a cama do casal, havia algum dinheiro, colocado previamente pelo dono da casa. Ainda que tenham tocado nos jornais, nada encontraram; e do calçado velho, não fizeram o mínimo caso.

Assim que pôde, Manoel Quincas dirigiu-se para a Mata dos Angicos. Aproximou-se cautelosamente. Em dado momento, divisou um vulto agachado, tomando posição, procurando se ocultar. Logo concluiu que deveria ser um revolucionário que ainda estava no local e, ao avistá-lo, pretenderia prendê-lo. Apressou-se a gritar:
- Quem está aí?
 O susto foi ainda maior para o interpelado. Era Elpídio. Os revoltosos já tinham partido.

  Cel Bráulio Ferraz

Aqueles dias eram de apreensão. Os revoltosos ameaçavam inclusive entrar em Floresta. O IPAC/PE, no seu Inventário do Patrimônio Cultural de Pernambuco, edição de 1987, abordando o Sertão do São Francisco, diz, à folha 113, que em “1926, um grupo da Coluna Prestes invadiu a igreja” do Rosário “para se abrigar por alguns dias”. Como outras coisas que diz, nada mais falso. Aqueles militares jamais entraram na cidade de Floresta, onde uma força civil organizada por Ildefonso Ferraz e sob a coordenação do Prefeito Manoel Serafim de Souza Ferraz (Duel) estava sempre a postos e pronta para a defesa. Se os revoltosos tivessem tentado entrar na cidade, poderiam arrazá-la. Felizmente não tentaram.

Cangaço - tempos difíceis

Naqueles anos, a falta de segurança era total. Além dos revoltosos, Lampião, atacando e roubando os fazendeiros, fazia com que os criadores e agricultores vivessem em constante sobressalto. Manoel Quincas chegou a receber bilhetes de Lampião, pedindo dinheiro.

As ações do cangaceiro não deixavam dúvidas sobre suas intenções e periculosidade. Ameaçava constantemente a família Ferraz. Os que tinham condições procuraram levar seus familiares para a cidade, onde a segurança e a possibilidade de defesa eram sempre maiores. Tomando conhecimento de que Virgulino estava nas redondezas, Manoel Quincas — sempre viajando, no seu comércio de gado — não fez diferente: retirou a família. Deixou ali apenas o sobrinho Elpídio e o filho Bráulio para darem água aos animais e realizarem tarefas indispensáveis. Em virtude do risco a que se expunham, os dois permaneceram ali armados e bem municiados. Duas mulheres já idosas, “sia” Firmina e “sia” Joana, faziam a comida dos jovens. A primeira era a mãe e a segunda a avó de Manoel Batinga, morador de Manoel Quincas no Poço das Baraúnas.

Num certo dia de agosto de 1928, Bráulio encontrava-se no chiqueiro, ordenhando as cabras, quando viu Miguel Yoyô (da fazenda Mandacaru, na margem esquerda do Mandantes) chegar montado num cavalo que estava coberto de suor. Viera avisar que Lampião fora visto nas Areias e se dirigia à região circunvizinha.

Pouco podia fazer. Elpídio tinha ido a Floresta. O gado, naquela seca, caindo de fraqueza, teria de ser controlado na descida para a fonte, percorrendo estreito corredor em rampa, cerca de 20 metros de extensão, que ia dar no bebedouro, a 40 palmos de profundidade. Armado de rifle e bem municiado, Bráulio permaneceu naquele corredor, emparedado pelas ribanceiras, mas exposto a todos os riscos.

Na tarde daquele dia, sentou-se na varanda da casa e passou a ler uma revista. De repente, erguendo os olhos, avistou um grupo armado que caminhava em sua direção. Levantou-se rápido, com o rifle na mão e o bornal de balas a tiracolo. Tomou posição na porta de entrada, abrigando-se tanto quanto possível das balas que, esperava, logo seriam deflagradas contra ele. O grupo era numeroso. Já se preparava para tentar uma fuga pelos fundos da casa quando, aliviado, reconheceu Manuel Neto à frente. Era a volante da Polícia, cujo uniforme se confundia com o dos cangaceiros.

Bráulio guardou o rifle e o bornal, saindo para receber a polícia. Manuel Neto, com o semblante trancado de sempre, cumprimentou o jovem e perguntou como se chamava a fazenda e quem era o proprietário. Informado, perguntou por notícias de Lampião.

Depois de satisfeito, disse que queria barrar a passagem do bandido, que pretendia passar para a Bahia. Adiantou que Lampião, perseguido insistentemente pelas volantes sob o comando geral do major Theóphanes perdera muitos dos seus elementos e o grupo se encontrava reduzido a cerca de 10 cangaceiros.

A seguir, pediu que lhe fosse indicado o caminho para a fazenda Poço Verde. Bráulio ofereceu-se para levá-lo até lá. O militar disse não ser necessário, mas o jovem insistiu e foi tomando o caminho, desarmado. Manuel Neto, então, determinou-lhe para ir buscar o rifle e o bornal, adiantando que notara, à chegada, que ele estava armado e municiado.

Nessa ocasião, Manuel Neto não conseguiu impedir a passagem de Lampião para a Bahia. A travessia se deu a 21 de agosto e o grupo se compunha de seis cangaceiros.

Capítulo de seu livro "Floresta uma Terra - um Povo", 1996, editora: Fiam. 

Imagens: Genealogia Pernambucana

Mensagem dos rastejadores

Agradecimento e correção 

*Em virtude da publicação: Faleceu o homem que enterrou Lampião

A família do Cabo Grilo agradece emocionada pela nota. Ao mesmo tempo, informa que o motivo da morte foi falência múltipla dos órgãos após luta contra um câncer no pâncreas. Tinha 92 anos e deixou esposa, filhos, netos, bisnetos, todos muito saudosos.

 Geminiano Luís Sarmento - o Cabo Grilo


O Lampião Aceso agradece a atenção e estende seu abraço fraterno a todos os familiares, parentes e amigos.

sábado, 24 de julho de 2010

Agora é oficial

Obra essencial foi reeditada


O Lampião aceso já havia publicado a informação há mais de um ano, mas só agora foi confirmada que o famoso livro " DE VIRGOLINO A LAMPIÃO ", cuja 1ª edição esgotada, já há algum tempo, foi reeditado e está sendo vendido pelos autores Antonio Amaury e Vera Ferreira (Neta de Virgulino e Maria).


A obra traz algumas fotos inéditas, bem como recebeu uma nova roupagem. Sendo considerado, um dos melhores livros sobre Lampião, uma vez que trata a história do bandoleiro, na forma cronológica dos principais fatos que envolveram sua vida cangaceira.


Para os estudiosos do cangaço, vale a pena ter a presente obra nas vossas bibliotecas. Informo aos interessados o contato com o mestre Antonio Amaury
email: aamaurycangaceiro@gmail.com (11) 2979 - 7757 / 2972 - 4824.

E com Vera Ferreira (além do email indicado na terceira imagem). (79) 9 9191 - 4088.


Informações de: Kiko Monteiro e Ivanildo Silveira

Scans

Revista Fatos e Fotos – 29 de Setembro de 1975.


Entrevista realizada por Ricardo Noblat com o cangaceiro “Cascavel”, cabra de Antonio Silvino.

Clique para ampliar.






Créditos: Ivanildo Silveira

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Enquanto não chega o Cariri Cangaço

Prefeituras de Canindé/SE e Piranhas/AL promovem evento


Dias 29 e 30 de Julho de 2010 será realizada nas cidades de Canindé de São Francisco / SE e Piranhas / AL a Semana do Cangaço . O evento é uma iniciativa da CANISTUR Serviços Turísticos e da Angico Tour Receptivo e tem como objetivo divulgar a História do Cangaço e suas diversas formas de contribuição para sociedade sertaneja nordestina.

UM POUCO DE HISTÓRIA ....

O Cangaço surgiu no século XVII no Estado de Pernambuco permanecendo por quase 200 anos como uma saída para jovens sertanejos ávidos por justiça e aventura como também um grande problema para autoridades nordestinas encarregadas em debelar o banditismo rural.Várias personagens fizeram parte dessa história recente do Brasil que teve como o cenário o sertão nordestino, dentre eles podemos citar : Jesuíno Brilhante, Adolfo Meia-Noite, Lucas da Feira, Antonio Silvino, Sinhô Pereira, Lampião e Corisco, além de volantes (policiais) e coiteiros (informantes dos cangaceiros).

Um dos fatos mais importantes da história do Cangaço foi o surgimento de Virgolino Ferreira da Silva, o famoso Lampião, que se tornou uma lenda viva do Nordeste das décadas de 20 e 30 do século XX , além de ficar conhecido mundialmente através da imprensa nacional e estrangeira.
Com a morte de Lampião, Maria Bonita e mais 09 companheiros em 28 de Julho de 1938 na Grota de Angico entre os municípios de Canindé de São Francisco e Poço Redondo / Sergipe, o Cangaço praticamente teve seu fim após quase 200 anos de existência no Nordeste brasileiro.

Passados 72 anos da morte de Lampião e parte do seu bando na Grota de Angico, o Cangaço nos dias atuais é considerado como um fenômeno social que mudou a face do sertão nordestino em vários aspectos importantes dentro da formação da sociedade nordestina.

PROGRAMAÇÃO

Dia 29 de Julho de 2010 – Quinta –Feira – Canindé / SE 
Local :  Não definido pela organização.


16:00 h – Abertura da Semana do Cangaço  
16:20 h – Palestra : Cangaceiras – Mulheres Guerreiras 
Palestrante: João de Sousa Lima – Pesquisador ,Escritor e Biografo de Maria Bonita ligado a SBEC - Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço. 
17:00 H – Intervalo  
17:10 h – Palestra :Rota do Cangaço XingóTurismo e Cangaço, vetores de desenvolvimento para região de Xingó. 
Palestrante : Jairo Luiz Oliveira – Turismólogo - Idealizador da Rota do Cangaço Xingó.
17:40 h – Debates. 
18:20 h – Exibição do documentário “A violência oficializada no tempos do Cangaço” de Aderbal Nogueira.  
18:40 h – Apresentação do repentista Vem Vem do Nordeste e Sávio do Acordeon. 
19:20 h – Encerramento: Shows artísticos com Sávio do Acordeon.

Dia 30 de Julho de 2010 – Sexta-Feira - Piranhas/AL
Local : Centro Social Esportivo Piranhense –Centro Histórico - Piranhas / AL

- MANHÃ LIVRE PARA VISITAS - 

16:00 h – Palestra : “ Os Últimos Dias do Cangaço 
Palestrante ; Inácio Loiola Damasceno Freitas – Pesquisador e Historiador.  
16:40 h – Intervalo. 
16:50 h – Palestra: “Mentiras e Mistérios de Angico”
Palestrante : Alcino Alves Costa – Pesquisador e Escritor ligado a SBEC – Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço - SBEC. 
17:20 h – Debates. 
18:00 h – Exibição do documentário “ Mistérios e Mentiras de Angico” de Aderbal Nogueira.
19:00 h - Shows artísticos com trio de Forró Pé de Serra "Capiá" - Centro Histórico - Piranhas / AL.

Blog do evento: Semana do Cangaço

terça-feira, 20 de julho de 2010

Baixas

A morte do cangaceiro Chico Pereira 

Por Volney Liberato (*)

“Desde o dia em que um desconhecido foi morto pela polícia na estrada de Currais Novos, espalhou-se pelo sertão, vaga mas persistente, a suspeita de que ali morrera outro que não Chico Pereira”.
< (Padre Pereira – in Vingança, não!).

 Currais  Novos na vida de Chico Pereira

“Derna do tempo d'eu menino”, quando a escritora pernambucana Aglae Lima de Oliveira respondia sobre “Lampião” no Programa J. Silvestre, na extinta TV Tupi, que eu começei a me interessar, a ler e a pesquisar sobre o cangaço – e isso já vão mais de 30 anos. 

Tempos depois, ao passar pela BR 226, quase a entrada da cidade, deparei-me com um cruzeiro erguido para sinalizar o local onde morreu o cangaceiro paraibano Chico Pereira. Depois disso, ao visitar o Museu do Acari (onde funcionou a antiga Cadeia Pública), vi a foto do citado cruzeiro, com uma outra foto de Chico Pereira, aí comecei a nutrir a curiosidade de ler o livro “Vingança, não! - Depoimento sobre Chico Pereira e Cangaceiros do Nordeste”, 5ª ed. Rep's Gráfica e Editora – João Pessoa / PB – 2004, de F. Pereira Nóbrega (Padre Pereira), filho do cangaceiro Chico Pereira, que naquele quase amanhecer do dia 28 de outubro de 1928, pereceu macabramente, exatamente no KM 177 da hoje rodovia BR 226, próximo a cidade de Currais Novos, pelas mãos de uma escolta policial, que tinha no comando nada menos do que o famigerado então Tenente Joaquim de Moura.

A escolta era ainda composta pelo sargentos Luís Auspício e Feliciano Tertulino, sendo o “chofer” o sargento Genésio Cabral de Lima. O livro citado, na época, era difícil, pois até hoje só foram feitas cinco edições do mesmo, e é esta última que encontra-se em minhas mãos hoje, que me foi entregue pelas mãos de um companheiro também pesquisador, a quem agradeço que, dia 08 de Janeiro, colocou-lhe sobre a minha mesa, no Detran. Ali estava mais de 20 anos de espera, por aquele que, um dia, seria o delator da verdadeira história da morte do cangaceiro Chico Pereira, nos “aceros” de Currais Novos.


Chico Pereira

A história se inicia quando Chico Pereira, paraibano de Sousa, já envolvido numa questão de vingança familiar e já andando debaixo da “canga”, é acusado – injustamente, segundo relatos da época – de ter, junto com um pequeno bando, assaltado uma propriedade, na Rajada, de Joaquim Paulino de Medeiros, o legendário coronel Quincó da Ramada. Chico foi preso na Paraíba e recambiado para a detenção de Natal, onde responderia juri no Acari.

No dia 28 de Outubro de 1928, a escolta que o recambiava algemado para o Acari, comandada pelo Tenente Joaquim de Moura, estanca a poucos quilómetros da entrada de Currais Novos, numa parte da estrada de terreno elevado, tirando-o da carroceria e o golpeando a coices de fuzil. Já no chão, ferido de morte, o Tenente Moura ordena ao sargento Genésio para precipitar o carro sobre o corpo de Chico Pereira, numa altura de alguns metros, o que fez com que o corpo fosse esmagado em algumas partes (cabeça e abdómen).

Os participantes da escolta passaram então a ferirem-se mutuamente, para fazerem crer que realmente tinham sido vítimas do desastre que vitimou fatalmente somente o preso. Enquanto eram “atendidos” em Currais Novos, o corpo de Chico Pereira era levado para a Cadeia, na então Rua do Rosário (hoje Vivaldo Pereira), onde permaneceu exposto á visitação pública até a hora do seu sepultamento, que ocorreu lá pelas 21 horas, no Cemitério Público de Santana, em cova hoje não mais identificada.

A verdade é que Chico Pereira jamais havia posto os pés em Currais Novos, e quando o fez foi tão somente por alguns minutos, que separaram a sua vida da sua morte. Pisou no solo curraisnovense o tempo necessário para permanecer de pé e receber as coronhadas de fuzil que o vitimou e ser também vítima de um plano macabro, e por que não dizer “político”.

O advogado de Chico Pereira, em Natal, era ninguém menos do que João Café Filho, o criador de dezenas de sindicatos na capital, e que por isso ganhou a pecha de “comunista”. Era plano de Café Filho acompanhar a escolta, de seu carro, de Natal ao Acari, para assim ter certeza da integridade física do seu constituído. Mas, uma pessoa do seu relacionamento, alertou-o: “Se a polícia vai mesmo matar Chico Pereira, pelo caminho, não vai deixar testemunhas sem farda. Na certa você morrerá também”. Café então retornou para Natal.


O advogado e ex-presidente da república do Brasil 
João Café Filho

No dia seguinte, lá pelas 10 horas da manhã, recebe telegrama narrando-lhe o “desastre” e a morte “acidental” do seu constituído. O Tenente Moura era “pau-mandado”, como se dizia, do governo do estado, que tinha Juvanal Lamartine no poder. O coronel Quincó era gente grande no dinheiro e na política regional, influente nas eleições de voto de cabresto e possuidor de curral eleitoral nutrido. Por isso, gente grada aos interesses da burguesia instalada no comando do poder estadual.

Mas, se a morte de Chico Pereira se deu, involuntariamente, em Currais Novos, a do Tenente Joaquim de Moura, por ironia do destino, também. Anos mais tarde, já nos anos 40, o já então Coronel Joaquim de Moura vem a Currais Novos, sob pretexto de participar de uma festa numa fazenda avizinhada á cidade. Mas o verdadeiro motivo da estada do coronel Moura em Currais Novos, segundo me relatou o saudoso Euzébio Hipólito de Azevedo, carnaubense, octogenário, que conheceu o Coronel Joaquim de Moura de perto e privou de sua amizade, que o motivo da sua vinda a Currais Novos era para se “acertar” com uma certa mulher – casada – oriunda de uma família “importante” do município, que havia tido um caso com ele na capital.

Como o coronel apaixonou-se pela tal mulher, veio disposto a tudo, até ameaçando matar o marido dela, caso ela não aceitasse juntar-se a ele. Pela tarde, o coronel Moura sente-se mal e é acometido de um ataque cardíaco, vindo a falecer. Contou-me ainda Euzébio que, seu corpo foi vestido com a farda da Polícia - mandada buscar em Natal ás pressas - numa casa de esquina, que depois pertenceu a Severino Maroca, na atual Rua Dix-Sept Rosado (hoje residência de Maria José Mamede Galvão). O destino fatal uniu as duas personagens: Chico Pereira e Joaquim de Moura. Vítima e algoz, ambos finando-se em Currais Novos, em épocas diferentes, numa cidade em que ambos não tinham a menor relação.

O capítulo que trata da morte de Chico Pereira, em Currais Novos, é intitulado “O Morto que Ninguém Chora”, e é escrito de uma forma, digamos, poética, dada a verve do autor, que não conhecia Currais Novos, mas a descreveu tão bem, como resultante dos depoimentos, que mais parecia um curraisnovense contemporâneo dos fatos, descrevendo a vida e os costumes da nossa comuna, naquele distante e fatídico 1928.

 Quem passa diariamente por aquele trecho da Maniçoba, talvez não perceba esta capelinha lá existente, a esquerda da Rodovia BR 226, sentido Currais Novos-Natal. Foi o exato local que o cangaceiro Chico Pereira foi assassinado quando vinha responder júri no Acari. E o pior é que Chico Pereira morreu inocente, pois nenhum crime seu foi constatado pela justiça norte-riograndense.

Bela Vista dos Currais Novos, 08 de janeiro de 2008.

*Volney Liberato é filho de Currais Novos, Seridó - RN. Bacharel em Administração pós-graduado pela UFRN; repórter pela Oficina de Jornalismo "Genival Rabelo"; pesquisador do cangaço, história regional e cultura popular.


Pesquei no: Imaterialcn


Adendo:

Ruínas do casarão pertencente a Chico Pereira de Nazarezinho, Situado no sítio Jacu, município de Nazarezinho, encontra-se, infelizmente em ruínas. 

Créditos: BLOG DO MIRANTE